Moçambique: bem-vindos ao bairro de Mumemo
Foi uma história triste de abandono familiar, que me contaram dois ou três dias antes do Natal passado (uma história capaz de fazer chorar se não as pedras pelo menos os amigos mais sensíveis com quem a partilhei), que me levou a passar a manhã do domingo de Páscoa em Mumemo, um bairro no distrito de Marracuene, a cerca de 30 quilómetros a norte de Maputo e nascido do nada pela mão da Congregação das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição (e com a ajuda de instituições como a Caritas e de parceiros como o Ministério do Trabalho e Solidariedade Social de Portugal).
Mumemo, também conhecido como Bairro 4 de Outubro, foi construído de raiz, no meio de mato que teve de ser cortado e desbastado, para acolher 1777 famílias, cerca de 10 mil pessoas, do bairro Chamanculo C, um bairro insalubre dos subúrbios da capital, com casas feitas de restos de chapa e caniço e destruído em grande parte pelas cheias de 2000 e 2001. Tem actualmente, para além das casas de habitação espalhadas por lotes de terreno muito certinhos e todos do mesmo tamanho, furos para abastecimento de água e fontes públicas, hortas familiares (ou machambas), um centro de saúde, um jardim de infância, uma escola primária completa, uma escola profissional, a São Francisco de Assis e com cursos de mecânica, carpintaria ou moda e confecções, um mercado, um aviário e uma padaria para garantir o abastecimento da população e alguma auto-sustentabilidade do projecto, uma farmácia a Doi Doi, um centro social, com um espaço destinado à comissão de moradores, e dois lares de internato, um para raparigas e outro para rapazes.
E é no lar dos rapazes que foi acolhido e que vive desde o final do ano passado o rapaz da história triste, na companhia de mais de uma centena de crianças e jovens sem família ou sem família que os possa (ou queira) criar. Conhecê-lo e mostrar-lhe que há quem se preocupe com ele foi o objectivo da nossa visita. Mas também conhecer o trabalho que ali se faz e levar um pouco de ajuda a quem ajuda tanto e tanta gente.
Depois de uma volta pelas instalações (com o prémio da arrumação a ser atribuído a uma das camaratas, com 12 beliches e com os sapatos todos em fila e os livros e os cadernos organizados em montinhos) ficámos à conversa com a Irmã Rita, que nos recebeu e que eu já conhecida de uma ida à Casa Madre Maria Clara, em Maputo (ver aqui). E também com uma trintena de miúdos, os que ficaram nesse fim de semana no centro por não terem com quem ir passar a Páscoa. Foram-se apresentando à vez: têm idades entre os cinco e os vinte e tal, muitos vieram de fora da capital (de Inhambane ou da província de Gaza), alguns falam tão baixinho que mal se conseguem ouvir, alguns estão atrasados nos estudos. Mas também há quem tenha sete anos e saiba escrever e ler na perfeição ou quem tenha começado a estudar só aos 14, fazendo cinco classes em dois anos e hoje, com 20, ande no terceiro ano de contabilidade.
Uns dias mais tarde, comento ao telefone com a nossa anfitriã, que se sente feliz por haver "pessoas de fora" que lhes querem bem, a timidez de grande parte dos rapazes e a diferença com o ambiente que se vive nos lares que acolhem raparigas nas mesmas condições. Explica-me que as meninas são muito livres, que desabrocham num abrir e fechar de olhos e que lhes basta ter um vestido bonito ou fazer maquilhagem para ficarem felizes. Já os rapazes, pelas histórias que carregam, são mais fechados e tristes. Mas diz-me que o nosso rapaz "há-de sair dessa" e que eu tenho de lá voltar com mais tempo para ver a transformação. E tenho mesmo, até porque as promessas são para cumprir: o rapaz ainda sem sorriso tem saudades de quem o acolheu primeiro em Maputo, antes de rumar a Mumemo, e eu fiquei de o levar até lá numa próxima estadia em Moçambique.
A Congregação das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição, que nasceu em Portugal há mais de 100 anos e que está em Moçambique desde 1922, toma conta de mais de 900 crianças órfãs ou vulneráveis, distribuídas por seis centros em vários pontos do país. Pelo que toda a ajuda é bem vinda. O que pode ser feito através do apadrinhamento de uma criança, de trabalho voluntário ou de doações (de dinheiro, roupas, materiais escolares, alimentos, produtos de higiene ou outros bens). Contactos: +258 824931320 (freira Susana Custódio Marques, coordenadora do projecto Mumemo) ou +258 823597715 (freira Rita Veloso da Rocha, coordenadora adjunta e dinamizadora do projecto).
A história da Congregação, que também está presente no Brasil, nas Filipinas ou em Timor, pode ser conhecida aqui. E neste site conta-se a história de Mumemo e faz-se um retrato de como é o bairro na actualidade.
Mumemo, também conhecido como Bairro 4 de Outubro, foi construído de raiz, no meio de mato que teve de ser cortado e desbastado, para acolher 1777 famílias, cerca de 10 mil pessoas, do bairro Chamanculo C, um bairro insalubre dos subúrbios da capital, com casas feitas de restos de chapa e caniço e destruído em grande parte pelas cheias de 2000 e 2001. Tem actualmente, para além das casas de habitação espalhadas por lotes de terreno muito certinhos e todos do mesmo tamanho, furos para abastecimento de água e fontes públicas, hortas familiares (ou machambas), um centro de saúde, um jardim de infância, uma escola primária completa, uma escola profissional, a São Francisco de Assis e com cursos de mecânica, carpintaria ou moda e confecções, um mercado, um aviário e uma padaria para garantir o abastecimento da população e alguma auto-sustentabilidade do projecto, uma farmácia a Doi Doi, um centro social, com um espaço destinado à comissão de moradores, e dois lares de internato, um para raparigas e outro para rapazes.
E é no lar dos rapazes que foi acolhido e que vive desde o final do ano passado o rapaz da história triste, na companhia de mais de uma centena de crianças e jovens sem família ou sem família que os possa (ou queira) criar. Conhecê-lo e mostrar-lhe que há quem se preocupe com ele foi o objectivo da nossa visita. Mas também conhecer o trabalho que ali se faz e levar um pouco de ajuda a quem ajuda tanto e tanta gente.
Depois de uma volta pelas instalações (com o prémio da arrumação a ser atribuído a uma das camaratas, com 12 beliches e com os sapatos todos em fila e os livros e os cadernos organizados em montinhos) ficámos à conversa com a Irmã Rita, que nos recebeu e que eu já conhecida de uma ida à Casa Madre Maria Clara, em Maputo (ver aqui). E também com uma trintena de miúdos, os que ficaram nesse fim de semana no centro por não terem com quem ir passar a Páscoa. Foram-se apresentando à vez: têm idades entre os cinco e os vinte e tal, muitos vieram de fora da capital (de Inhambane ou da província de Gaza), alguns falam tão baixinho que mal se conseguem ouvir, alguns estão atrasados nos estudos. Mas também há quem tenha sete anos e saiba escrever e ler na perfeição ou quem tenha começado a estudar só aos 14, fazendo cinco classes em dois anos e hoje, com 20, ande no terceiro ano de contabilidade.
Uns dias mais tarde, comento ao telefone com a nossa anfitriã, que se sente feliz por haver "pessoas de fora" que lhes querem bem, a timidez de grande parte dos rapazes e a diferença com o ambiente que se vive nos lares que acolhem raparigas nas mesmas condições. Explica-me que as meninas são muito livres, que desabrocham num abrir e fechar de olhos e que lhes basta ter um vestido bonito ou fazer maquilhagem para ficarem felizes. Já os rapazes, pelas histórias que carregam, são mais fechados e tristes. Mas diz-me que o nosso rapaz "há-de sair dessa" e que eu tenho de lá voltar com mais tempo para ver a transformação. E tenho mesmo, até porque as promessas são para cumprir: o rapaz ainda sem sorriso tem saudades de quem o acolheu primeiro em Maputo, antes de rumar a Mumemo, e eu fiquei de o levar até lá numa próxima estadia em Moçambique.
A Congregação das Irmãs Franciscanas Hospitaleiras da Imaculada Conceição, que nasceu em Portugal há mais de 100 anos e que está em Moçambique desde 1922, toma conta de mais de 900 crianças órfãs ou vulneráveis, distribuídas por seis centros em vários pontos do país. Pelo que toda a ajuda é bem vinda. O que pode ser feito através do apadrinhamento de uma criança, de trabalho voluntário ou de doações (de dinheiro, roupas, materiais escolares, alimentos, produtos de higiene ou outros bens). Contactos: +258 824931320 (freira Susana Custódio Marques, coordenadora do projecto Mumemo) ou +258 823597715 (freira Rita Veloso da Rocha, coordenadora adjunta e dinamizadora do projecto).
A história da Congregação, que também está presente no Brasil, nas Filipinas ou em Timor, pode ser conhecida aqui. E neste site conta-se a história de Mumemo e faz-se um retrato de como é o bairro na actualidade.
Muito bonito Dra. HM. De facto, comovente.
ResponderEliminar“... o rapaz sem sorriso (ainda!) tem saudades de quem o acolheu primeiro em Maputo, antes de rumar a Mumemo, e eu fiquei de o levar até lá na próxima estadia em Moçambique.” Pergunto: Quem terá sido?
Olá José Alberto (e trate-me por favor por Helena, sem o tão formal dra.). Quem o acolheu? Uma instituição onde foi bem tratado mas onde não era suposto alguém tão jovem ficar a viver.
ResponderEliminar