Salinas do Samouco: no Trilho do Flamingo


"Queiram vir", "Queiram chegar mais para trás", "Tenho de gerir o tempo", "Agora têm direito a duas perguntas", foi-nos dizendo o guia Luís Avelar, naturalista, que assim tentava disciplinar um grupo de 22 visitantes, constituído por 20 amigos que gostam de juntar caminhada e conversa e por dois miúdos curiosos. Mas também quem é que não gostava de saber quem terá sido o predador de um alfaiate, ave que é o símbolo da Reserva Natural do Estuário do Tejo e do qual só restavam as penas espalhadas pelo chão (talvez uma raposa, pela forma como as penas foram arrancadas) ou que bicho terá afinal regurgitado uma bola cheia de ossinhos de um coelho que o guia encontrou à beira do caminho, juntamente com a tíbia do animal predado?

Percorríamos na sua companhia e num domingo de manhã os quase cinco quilómetros do Trilho do Flamingo nas centenárias Salinas do Samouco, em Alcochete, que têm entrada junto às antigas instalações da Sociedade Nacional dos Armadores de Bacalhau e do Secadouro de Alcochete, agora ao abandono. A exploração de sal no Samouco, uma área de 360 hectares e que chegou a ter 56 salinas e mais de 1000 salineiros no activo, data do século XIII e teve o seu ponto alto entre os anos 1932 e 1936, altura em que era o principal centro de produção salineira na região de Lisboa. Actualmente, apenas uma salina, a do Canto, permanece em actividade, produzindo por ano, artesanalmente, entre 100 a 200 toneladas de sal e umas duas de flor de sal. O trabalho, que começa em Março com a limpeza dos tanques, esteve na última temporada a cargo de um salineiro e de cinco ajudantes.

As Salinas do Samouco, geridas pela Fundação para a Protecção de Gestão Ambiental das Salinas do Samouco, criada em 2000 como contrapartida pela construção da ponte Vasco da Gama, são hoje sobretudo um local onde milhares de aves, algumas residentes, outras migratórias, procuram abrigo, alimentação e um sítio seguro para se reproduzirem. Munidos de binóculos previamente focados e incluídos na visita, avistámos um bando de flamingos (da espécie greater flamingo, que podem viver entre 20 a 30 anos), dois pernilongos (o macho com o dorso preto, a fêmea com o dorso castanho), uma garça branca pequena (uma das espécies que fica por ali todo o ano), um peneireiro cinzento (espécie que não existe no norte da Europa), alguns guinchos (que são gaivotas pequenas) e ainda uns maçaricos de bico direito e um pata vermelha. Deu para colocar várias cruzinhas na brochura que contém a lista de aves que se podem observar.

O Trilho do Flamingo – uma das duas propostas de percurso, sendo que há também o Trilho do Pernilongo, de seis quilómetros, que passa por uma zona de sapal – levou-nos à Casa do Sal e à Casa do Engenho, ao estábulo dos fotogénicos burros mirandeses, uma raça portuguesa em vias de extinção e que a Fundação das Salinas do Samouco decidiu ajudar a preservar e à horta de um antigo salineiro que anda na casa dos 90 anos. Essa horta não faz parte do projecto hortas sociais, destinadas sobretudo a reformados ou beneficiários de apoios sociais e residentes em Alcochete e localizadas junto à Estrada Municipal, mas é usada pela Fundação nas visitas realizadas para as escolas.

Alcochete fica a 2,5 quilómetros da entrada das salinas e depois de três horas de caminhada é para lá que segue o grupo, em busca dos petiscos de O Marítimo, restaurante localizado no Bairro das Barrocas, centro da vila ribeirinha e bairro de ruas estreitas, habitado ao longo dos anos por pescadores ou salineiros. Somos recebidos na esplanada, numa mesa de tamanho XL, e saímos de lá felizes depois de umas sardinhas frescas grelhadas em pleno Outono e de um choco frito serviço em doses que não deixarão ninguém com fome. Tenha-se a sorte de encontrar por lá o guitarrista e cantor angolano Varela e o almoço pode ter os clássicos de Bonga ou Roberto Carlos como banda sonora. Ou outras músicas à escolha do ouvinte. Varela  aceita "discos pedidos".














 





















As Salinas do Samouco, que têm uma loja que vende o sal e a flor de sal ali produzidos, estão abertas de Outubro a Fevereiro todos os dias das 8h às 17h e de Março a Setembro das 8h às 17h de segunda a sexta e das 10h às 19h aos sábados e domingos (as últimas entradas para percursos pedestres devem ser feitas até duas horas antes do fecho). Podem ser visitadas por conta própria, a pé ou de bicicleta (4 euros para adultos, com desconto para jovens e maiores de 64 anos) ou a pé na companhia de um guia (5 euros por pessoa, para um mínimo de dez visitantes). Mais informações no site ou através do telefone 212348070 ou do e-mail andre.batista@salinasdosamouco,pt.

O restaurante O Marítimo, que encerra domingo à noite e segunda todo o dia, fica localizado na Rua Comendador Estevão de Oliveira, 21, no centro de Alcochete. Geralmente só aceita reservas para as 12h30, para quem chega mais tarde é ficar na fila. Contacto: 212342625 ou página no Facebook.


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