Malaca: para terminar a Malásia em grande

Foi emocionante chegar a Malaca, a mais velha cidade da Malásia e desde 2008 Património Mundial da Humanidade, e na primeira noite encontrar alguém que ainda fala português (os portugueses estiveram ali entre 1511 e 1641), gente que tem apelidos como De Mello, Gomes ou Rodrigues ou que tem o telemóvel cheio de músicas portuguesas. Mesmo que a maior parte seja do Quim Barreiros e afins.
Escolhemos os restaurantes de peixe e marisco do Portuguese Settlement Village (à beira mar, no final da Jalan Albuquerque e um pouco afastados do centro) para o primeiro jantar na cidade. E depois de algum assédio e de alguma conversa (sobre o bacalhau que por ali não existe ou sobre a festa de São Pedro que se faz todos os anos no final de Junho) acabamos por nos sentar no número 8. Roy de Costa, que partilha o negócio (de pesca e restauração) com o pai, é o nosso também emocionado anfitrião (aponta para os braços e diz-nos que está arrepiado). Um anfitrião que se senta à mesa connosco, que faz questão de nos oferecer uma garrafa de vinho ou de cerveja (acaba por partilhar uma cerveja, apesar de só beber álcool uma vez por ano) e que nos conta como enfeita a moto com bandeiras e cachecóis quando joga a selecção portuguesa de futebol. Sobre Malaca diz-nos de Costa que é uma cidade pequena, com pouca coisa para ver.
O centro de Malaca percorre-se bem a pé ou de trishaw (é só escolher entre um enfeitado com a Hello Kitty ou outro com a Pantera Cor de Rosa), pelo que sobre ser pequena tem alguma razão. Já sobre o ter pouca coisa para ver não nos parece que tenha.
Malaca tem o que resta da presença dos portugueses - a bela ruína da igreja de Saint Paul no topo de uma colina com vista panorâmica e a muito fotografada Porta de Santiago, único vestígio da fortaleza Famosa -, tem igrejas (a Christ Church, anglicana e de cor vermelha, foi construída pelos holandeses em 1753), templos chineses (o Cheng Hoon Teng, de 1646, é o mais antigo da Malásia) e mesquitas (destaque para a Kampong Kling, aberta às visitas de não muçulmanos). Tem ainda museus para todos os gostos (de arquitectura, de arqueologia marítima, de história e etnografia, de literatura, do povo, da beleza, de selos, um sobre o Islão e um outro dedicado aos papagaios de papel) ou a réplica do palácio do sultão Mansur Shah (o Malacca Sultanate Palace).
Mas Malaca tem sobretudo uma elegante Chinatown, com casas com bonitas fachadas e pátios interiores, lojinhas de antiguidades, de bugigangas várias e de artigos religiosos (com destaque para os objectos em cartão que os chineses usam para queimar em alturas de festa), restaurantes simpáticos (na segunda noite jantámos no Bistro Year 1673, no número 18 da Jonker Street, e tivemos direito a uma visita de cortesia ao primeiro andar do edifício, uma casa chinesa antiga adaptada para jantares e eventos especiais) e alguns verdadeiros tesouros como o Baba & Nyonya Heritage Museum.
Situado nos números 48 a 50 da Jalan Tun Tan Cheng Lock, pode o Baba & Nyonya Heritage Museum ser visitado livremente ou integrando uma visita guiada em inglês (o preço é o mesmo, 16 ringgits, ou cerca de 4 euros, por pessoa). Escolha-se a segunda opção pois vale realmente a pena. É com humor e de uma forma interessante que se conta, enquanto se visita a sala de espera, a sala de jogar mahjong, os quartos ou a cozinha, a história da família a quem a casa dos finais do século XIX ainda pertence. E se explicam também os principais contornos de uma cultura que resultou da união de chineses e de malaios e que ficou conhecida como baba (nome dado ao homem) e nyonya (nome dado à mulher).
Regressamos às ruas (e ao calor) de Chinatown, onde ao final do dia havíamos de ser surpreendidos por fogueiras acesas um pouco por todo o lado (ainda mais calor), com imitações de notas atiradas ao ar e com velas e incenso colocados à beira dos passeios. Tentei perceber o que se festejava e depois de várias tentativas concluí que tinha algo a ver com "ghosts". Mais tarde, no abençoado Google, percebi que tínhamos estado no sítio certo, no dia certo. A "festa dos fantasmas famintos" realiza-se uma vez por ano, por alturas do 7º mês do ano lunar chinês. Foi esta a melhor maneira de nos despedirmos de Malaca. E quase da Malásia - faltava apenas rumar até Johor Bahru, a porta de entrada em Singapura.






































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