#1 Moçambicanos - Ussene Muzé, Ilha de Moçambique

Ussene Muzé, ourives de profissão, nasceu há 56 anos na Ilha de Moçambique, onde sempre viveu, tirando os quase cinco anos que passou na povoação de Casa Banana, na Gorongosa, província de Sofala, combatendo ao lado da FRELIMO, a Frente de Libertação de Moçambique, durante a guerra civil que aconteceu no país entre 1977 e 1992. Nesses tempos, "um bocado difíceis", Ussene diz que "comeu de tudo", muitas gazelas, mesmo elefantes ("A gente não escolhia"). Abundavam nessa altura os caçadores na Gorongosa e o próprio exército também tinha caçadores, que abasteciam as tropas (e as populações), às vezes com carne fresca, outras com carne que secavam no mato.

Regressou a casa em 1994, logo que desmobilizado, para retomar o ofício que aprendeu com o pai ainda em criança. Chegou a ter uma oficina e loja no "corredor", que é como na Ilha chamam à Rua dos Arcos, mas a renda era alta e acabou por se mudar para a casa actual, que já era a sua residência e que fica localizada no bairro Areal, na Cidade de Macúti. Agora, paga apenas ao Conselho Municipal uma licença que lhe custa 500 meticais por ano (cerca de 7 euros). É ali que faz, por encomenda, brincos, colares, anéis, braceletes ou pulseiras para as pernas, sobretudo para clientes locais e quase sempre quando há cerimónias ou casamentos. Trabalha com ouro, que está caro, apenas quando alguém o leva, e prata, que antes comprava em Nacala e que compra agora por vezes a "pessoas antigas" em Angoche.

Ussene, que tem sete filhos de três relações, o mais novo uma rapariga com "uns dez meses", é casado, embora solteiro no Registo Civil ("Aqui sempre há dificuldades no casamento. As nossas mulheres já não têm aquela consideração tão grande"). Acha que viveu dos momentos mais tristes sempre que a Ilha foi atingida por ciclones ("No último [o Gombe, em Março de 2022], esta nossa casa nenhuma chapa não tinha"). E que viveu dos melhores momentos antes "daquela confusão do Corona", quando as visitas eram mais frequentes. Agora, sonha em recuperar a loja, que está aberta todos os dias, mesmo sábados e domingos, entre as sete e meia da manhã e as cinco da tarde e onde trabalham ao todo cinco mestres. E sonha sobretudo que os clientes voltem a aparecer. [Ussene Muzé pode ser contactado pelo +258 844290916]








Retrato feito a partir de uma conversa realizada na Ilha de Moçambique a 3 de Fevereiro de 2023. É o primeiro de uma série sobre moçambicanos a ser publicada aqui no blogue.


Comentários

Enviar um comentário

Mensagens populares