29 horas na Suazilândia

Depois de me ter estreado há uns meses na movimentada fronteira Ressano Garcia numa ida ao Kruger Park, na África do Sul, desta vez deixo Moçambique pela verde vila da Namaacha em direcção ao Reino da Suazilândia, país que tem uma população de 1,1 milhão de habitantes e uma superfície mais ou menos equivalente a metade da Bélgica. E são 11h30 da manhã quando ficam cumpridas todas as formalidades na fronteira: do lado de Moçambique é necessário fazer uma exportação temporária da viatura e carimbar o passaporte, do lado da Suazilândia não há direito a carimbo mas é preciso declarar o transporte de máquinas fotográficas, computadores e binóculos - mas estes, que podem ser úteis para descobrir os animais nas reservas, acabam por não sair da mala. 
Por essa altura, quando o destino é o Hlane Royal National Park (que fica perto da fronteira e a uns quatro quilómetros da povoação de Simunye), já só pensamos em zebras, girafas, rinocerontes, hipopótamos, elefantes e sobretudo em leões (que nos escaparam em três dias de viagem pelo Kruger). Mas são dois pequenos burros à beira da estrada que nos dão as boas vindas a uma paisagem primeiro montanhosa e cheia de vegetação e logo depois de imensas planícies com plantações de cana-de-açúcar - havemos de encontrar algumas fábricas ao longo do percurso.
Na Hlane Royal, antiga reserva de caça real e espaço dedicado à reintrodução de leões na Suazilândia (são os únicos existentes no país), e depois de um piquenique quase molhado, optamos por um safari guiado num Land Rover. É esta a única maneira de aceder à área habitada pelos leões (os restantes espaços do parque podem ser percorridos em carro próprio mas a aventura pode não acabar bem). Bilhete comprado, o guia não garante um encontro com o maior dos felinos africanos. E informa-nos que o passeio que fez durante a manhã não foi um sucesso.
Partimos às duas da tarde e na primeira meia hora não há animais à vista, à excepção de muitas borboletas amarelas. Mas depois de uma chuvada intensa o tempo melhora e as expectativas de encontrar um leão confirmam-se da melhor maneira, não com um encontro mas com três: um primeiro com um leão na hora da sesta, muito sonolento (leio no guia Le Routard que estes animais dormem ou dormitam cerca de 18 horas por dia, o que nessa altura e devido à proximidade do bicho me pareceu uma boa notícia), um segundo que se esconde mais rápido do que o conseguimos fotografar e um terceiro, um pouco magricela, que se levanta e se põe a jeito para as câmaras. Perfeito! "Talvez nunca mais voltemos a estar tão perto de um leão", diz a nossa companheira de viagem. Talvez demasiado perto, direi eu.
O safari fotográfico prossegue com um encontro com uma manada de fêmeas e crias de elefantes, à qual se junta um macho gigante. E que por ali ficam a brincar na lama. E ainda uma girafa, algumas zebras, muitas gazelas ou impalas - são muitos os animais da classe dos antílopes e nem sempre é fácil saber qual a espécie que saltita à nossa volta.
Animais à parte, a volta pela reserva vale a pena também pela paisagem um pouco estranha. Há por todo o lado muitas árvores mortas (e fotogénicas) devido à destruição causada pelo apetite dos elefantes. O maior animal terrestre precisa de qualquer coisa como 150 a 200 quilos de alimento e cerca de 90 litros de água por dia.
O calmo e pouco frequentado Hlane Royal National Park oferece duas hipóteses de alojamento. O Ndlovu Camp, onde fica a recepção, um restaurante que serve o jantar a partir das seis da tarde (conseguimos, depois de alguma negociação, marcar para as sete) e um lago com hipopótamos e onde rinocerontes e elefantes vão beber água. E o Bhubesi Camp, a norte da reserva e a 12 quilómetros do primeiro. Este fica à beira de uma ribeira e tem seis casinhas que foram um presente, lê-se numa placa à entrada, do povo da África do Sul ao povo do Reino da Suazilândia. Foi inaugurado pelo rei Mswati III e é por ali, no meio da floresta e agora já com electricidade (que não existia até há pouco), que decidimos passar a noite (1120 rands para quatro, o equivalente a mais ou menos 76 euros ao câmbio actual).
O segundo dia começa com uma decisão que se vai revelar fatal, pelo menos para um dos pneus do nosso 4x4: sair da reserva não pelo norte em direcção à estrada principal mas voltar a percorrê-la pelas estreitas estradas de terra batida e rodeadas de vegetação em direcção ao Ndlovu Camp e sair pelo sul. Mas dois rinocerontes que teimam em ocupar o caminho estragam-nos os planos e fazem-nos por duas vezes mudar de direcção. Não nos atolamos numa zona pantanosa (da qual podíamos não ter saído) mas acabamos por rasgar o pneu e perder mais de duas horas de tempo. Como é proibido e perigoso sair do carro no meio da reserva, pedimos ajuda ao pessoal do parque (a rede telefónica funciona muito mal mas lá conseguimos ligar depois de muitas tentativas). E tudo acabou em bem, apenas mais tarde do que o previsto.
O resto da viagem, percorrendo o país em direcção ao sul (a segunda noite seria já passada perto do parque Hluhluwe - Imfolozi, na região de Kwazulu-Natal), foi tranquilo. Almoçamos em Big Bend, no Cafe 1896, e escolhemos um bife, já que tem fama a carne da Suazilândia. Na mesa ao lado, dois portugueses com ar de trabalharem por ali fazem uma pausa para um café. Nós seguimos para a fronteira de Lavumisa-Golela e partilhamos a estrada com muitos estudantes em uniforme, manadas de vacas e camiões carregados de cana-de-açúcar.
Na fronteira, os assuntos a tratar são rápidos (e desta vez com direito a carimbo no passaporte) e apenas com uma curiosidade a assinalar: há caixas de preservativos gratuitos por todo o lado, certamente numa tentativa de reduzir o recorde mais tenebroso do país: a Suazilândia tem a maior taxa de contaminação pelo vírus da sida do mundo.
E à saída, parto com a ideia de voltar. Talvez para visitar o mercado das quintas-feiras em Manzini, a maior cidade da Suazilândia (a capital é Mbabane), ou para ver a cascata de Phophonyane, a norte e perto da montanha de Emlembe, o ponto mais alto, com 1863 metros.






























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