Pomene: dois dias no fim do mundo

"Duas horas de tempo", responde-me o empregado quando lhe pergunto quanto demora a chegar a casa, onde regressa todos os dias e que fica do outro lado do estuário, mesmo em frente ao sítio onde nos encontramos e onde ele vai servindo pequenos-almoços, almoços e jantares (que bom o caranguejo inteiro com molho de caril) aos poucos hóspedes que ali se atrevem a chegar. E acrescenta, perante o meu ar de admiração, que "não é perto nem é longe, é normal". 
E o sítio onde nos encontramos, o remoto Pomene Lodge, na ponta norte da Reserva Nacional de Pomene, é assim uma espécie de fim de mundo e uma das opções de alojamento para quem visita esta reserva (com 200 quilómetros quadrados, é a mais pequena do país) criada em 1964 para proteger espécies como o boi-cavalo e a vegetação das dunas e dos mangais.
Da estrada nacional, com desvio mais ou menos a meio caminho entre Inhambane e Vilankulo e um pouco a norte de Massinga, são 58 quilómetros, os primeiros 30 em estrada de terra batida e alaranjada, os seguintes em estrada de areia mais ou menos em bom estado e os últimos sete num trilho de areia solta que faz qualquer um ter vontade de invocar  espíritos protectores para viajantes em apuros.
Uma vez chegados (e inteiros, nós e o 4x4, completamente obrigatório para tal destino), a tranquilidade e a beleza do local são proporcionais ao esforço investido. Por ali não há Internet, quase não há rede telefónica (e quando há só a Vodacom funciona) e a electricidade chega com hora marcada, entre as cinco e as dez da noite, e à custa de gerador. Mas há uma praia selvagem e deserta, um mar de águas quentes (ou muito quentes se optarmos por um banho no estuário, que aqui se encontra com o oceano), bandos de flamingos, muitos caranguejos para animar o areal, um ou outro pescador e um belo pôr-do-sol - que pode ser visto num passeio de barco ao final da tarde ou enquanto se toma um cocktail na esplanada junto à piscina e sobre a água (é só escolher entre um Pink Flamingo, um See Breeze ou um Sex on the Dunes). 
E há ainda noites embaladas pelo barulho do mar, que podem ser passadas numa das dez casinhas em madeira e palha e construídas em palafitas sobre a água (os números 59 e 60) ou mesmo à beira dela (as restantes), numa casa partilhada por quatro, seis ou oito pessoas ou em modo campismo (os preços são em rands, a moeda sul africana, mas ao câmbio actual e para a época baixa traduzem-se para cerca de 7 euros por pessoa para o campismo, 82 para quatro em alojamento partilhado e 111 para dois nos bungalows).

Pomene, que terá sido sido "descoberto" depois da abertura de um caminho para recuperar por terra a carga de um navio naufragado em 1962 (chamava-se Berea e transportava açúcar), é um bom destino para quem gosta de pesca (parece que por ali são os peixes mesmo grandes, tão grandes como os das histórias que os pescadores contam sobre eles), de observar aves e de fazer mergulho ou snorkeling (disponível para grupos de pelo menos quatro pessoas, número que não foi possível reunir aquando da nossa passagem). E que tem ainda como atracções adicionais um farol construído em 1913 no ponto mais alto da reserva (a 110 metros) e as ruínas de um velho hotel localizado nas rochas da Ponta da Barra Falsa - a uns cinco quilómetros a caminhar pela praia a partir do Pomene Lodge ou acessível por 4x4.
E foi aí que tive o mesmo pensamento que já me tinha assaltado na ilha do Ibo, no arquipélago das Quirimbas, há uns dois anos e meio, na primeira viagem a Moçambique: como pode um sítio tão em ruínas ser tão belo, quase hipnotizante? Pode, se lhe juntarmos um pedaço de História (neste caso escrita em português: o hotel data dos tempos coloniais mas só funcionou durante seis anos, até 1974) e uma localização perfeita. Ainda hoje podia estar por lá: a fotografar, a tomar banhos de mar, a ver o que resta do hotel a partir da praia ou a desejar que algum dia alguém invista na sua recuperação.





























































A entrada na reserva requer o pagamento de uma taxa para pessoas e veículos, sendo que nacionais ou residentes (com documento comprovativo) pagam 200 meticais (mais ou menos quatro euros ao cambio actual) e estrangeiros 400 (8 euros). Carros pagam 400 e caravanas 200.

Pomene tem população local e uma escola primária mas não tem lojas, multibanco ou posto de combustível (que em Moçambique também pode ser uma banca em madeira com meia dúzia de garrafas e garrafões). Apenas uma placa algures que indica "Bakery".

Pomene View Lodge, mais um investimento sul africano com preços em rands, é outra das opções de alojamento, com vista sobre o estuário e um pouco mais afastado do mar. Tem bungalows com uma pequena cozinha para cinco (preços equivalentes 55 euros para a época baixa e a 69 para a alta) ou seis pessoas (69 e 83 euros).

Os 58 quilómetros a partir da estrada principal podem demorar uma hora e meia ou duas a fazer. E para além de um 4x4 requerem um condutor experiente. E alguma sorte.


Comentários

  1. lindo e aprazível lugar, marcado pela calma e o gritar das ondas do mar, tamboreando nas rochas. mais lindo ainda é ver o repuxo cuspindo a águas pelos buracos nas rochas abertos pela divindade... Recomendo sempre Pomene!!!

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