Museu do Apartheid: para que não se repita o horror da segregação racial

Se na Cidade do Cabo é emocionante percorrer o District Six Museum ou visitar Robben Island, a ilha prisão onde Nelson Mandela passou quase 19 dos 27 anos em que foi feito preso político, em Joanesburgo é impossível ficar indiferente ao Museu do Apartheid. Hoje, dia em que se assinala o Dia Internacional de Luta Contra a Discriminação Racial, instituído pelas Nações Unidas em memória do massacre de Sharpeville, quando a 21 de Março de 1960 a polícia abriu fogo sobre uma multidão de 20 000 pessoas que protestavam pacificamente contra a Lei do Passe (os negros eram obrigados a ter um cartão com os locais onde lhes era permitido circular), provocando 69 mortos, relembro a ida ao museu inaugurado em 2001 e que é, junto com o bairro do Soweto, o maior ponto de interesse da cidade.
Visitei-o numa manhã de Outubro de 2019, na última viagem a África (e também a última viagem internacional antes de a Covid se abater sobre nós), acompanhada de outros turistas e de grupos de estudantes, com os seus uniformes cinzentos ou cor de vinho. Todos são recebidos no exterior pelos sete princípios da Constituição adoptada em 1996, gravados em pilares de pedra – Democracia, Igualdade, Reconciliação, Diversidade, Responsabilidade, Respeito, Liberdade – e por fotografias em grande formato de descendentes dos que a partir de 1886, gente da África do Sul mas também de outras partes do mundo, rumaram a Joanesburgo atraídos pela descoberta de ouro. E a todos os visitantes é atribuída uma de duas entradas, através de uma arbitrária classificação de raça, de brancos (blankes, em africânder, ou white, lê-se nos bilhetes e por cima de uma das portas) ou não brancos (nie blankes ou non whites).
E para lá da entrada, percorrido um corredor (no meu caso, o destinado a não brancos) rodeado por uma estrutura metálica a fazer lembrar uma prisão, com imagens ampliadas dos documentos que os negros eram obrigados a ter, chega-se ao imenso e intenso espólio do Museu, constituído por documentos, jornais, objectos (o maior será o Mercedes oferecido a Mandela, aquando da sua libertação),  fotografias e vídeos, que mostram como se vivia durante o regime do apartheid (palavra em africânder para separação), como se trabalhava ou como se morria e onde se podia ser sepultado. Há vídeos sobre a libertação de Mandela (que tem direito a uma exposição própria, dedicada às suas facetas de líder, de preso político, de negociador ou de homem de Estado) ou do discurso de Hendrik Verwoerd, ex-primeiro ministro eleito em 1948. Há fotografias de Ernest Cole, que fotografou a vida dos negros durante o período de segregação e que chegou a fotógrafo da Magnum, enquanto o seu livro House of Bondage foi banido da África do Sul durante o apartheid. Há muitos dados sobre a vida de Stephen Biko, estudante de medicina, fundador do Movimento da Consciência Negra e morto pela polícia aos 30 anos. Há documentos que mostram as leis sobre a segregação aprovadas entre 1949 e 1971 (148 no total), sendo a primeira a Lei de Proibição de Casamentos Mistos. Há uma sala com 131 nós suspensos do tecto, uma homenagem aos prisioneiros políticos mortos por traição.
O museu, localizado na zona Sul de Joanesburgo, junto ao parque de diversões Gold Reef City, e  actualmente encerrado por causa da pandemia, precisa de tempo, pelo menos três horas, idealmente um dia inteiro (e não é permitido fotografar no interior). No final, no jardim, podem os visitantes escolher a frase preferida de Mandela e colocar uma varinha da cor correspondente ao pensamento numa espécie de arranjo colectivo. Não me lembro se esta está por lá, mas é provável que esteja: "Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor da sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar."































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